Translate

terça-feira, 27 de outubro de 2020

Pré-Programados para Ler

 

A Aquisição da Linguagem. Talvez uma das maiores e mais extraordinárias faculdades que os seres humanos exultam no uso de um meio organizado de combinar as palavras para fins de comunicação. Como seres racionais que somos - inteligentes e cordatos com poderes decisórios e de interacção que nos fazem ser distintos das outras espécies - somos também o produto de algo ou alguém que um dia nos quis ver seus iguais. Ou nem tanto.

"Estamos constantemente a enviar e receber indicações e mensagens subtis uns aos outros desviando e sendo desviados, mesmo que o nosso cérebro racional não tenha deixado transparecer esse segredo."

                  (Ori Brafman e Rom Brafman, Irracional - O que Leva as Pessoas Inteligentes a Tomarem Decisões Erradas)

A linguagem define o que somos, por que somos e como somos. Mas nada nos identifica tanto quanto o que interiormente escondemos e possuímos em largo espectro de uma imensa e labiríntica caverna submersa em muitos segredos. 

Há quem afirme que são «Os segredos da alma» em estados dessa mesma condição que, introspectiva e emocionalmente, exibimos de forma diferenciada mas não negligenciada aquando nos sentimos tristes ou alegres, felizes ou infelizes. 

No entanto, é pela palavra que nos exprimimos, que nos damos a conhecer e a fazer entender numa ligação interactiva local ou global que tudo determina: do aperto de mão (anterior a esta pandemia que tudo nega, do simples abraço ao beijo) à vigilância-satélite que tudo domina sobre as nossas cabeças.

Como ainda estamos muito longe de recorrer às aptidões e apetências da Telepatia - sentindo não sermos ainda merecedores de tal alquimia cognitiva e neurológica - absorve-se então o que a Ciência nos diz sobre uma exemplar rede de linguagem do cérebro que, à semelhança de uma dádiva feérica de uma qualquer fada-madrinha, nos foi concedida à nascença.

Tal como um rebuscado software de extrema complexidade, assim nós somos. Daí que as perguntas sejam pertinentes e nunca ausentes de uma certa curiosidade: Seremos nós, seres humanos, a essência e confluência de algo maior que nos escapa ou ainda não percepcionamos na sua total magnitude de poder e factualidade, existência e verdade...???

Deixo aqui o repto, em resquício prólogo ou introdutório anteâmbulo do que não pode ser dito mas também não desmentido...

                                           Pré-definidos: «À sua imagem e semelhança...?»

Pré-programados para ler, além do que conceptualmente entendíamos como naturais métodos de Imitação (nos padrões de vocabulário infantis que reflectem os padrões das pessoas à sua volta e do seu meio-ambiente) e Condicionamento (na audição das elocuções que a criança faz, associando-as a determinados objectos e eventos do seu ambiente reproduzindo-as, e sendo compensada por isso), haja ainda muitas dúvidas - que não explicam de todo - a razão pela qual as crianças aplicam constantemente estruturas de linguagem e, palavras, a situações inéditas que nunca foram reforçadas...

Há que por isso reflectir muito bem se, em toda esta aferição linguística, não estará também todo um pré-elaborado esquema cósmico de processamento dessa racionalidade e inteligência - escrupulosamente muito bem executado, planeado e vinculado - a toda uma rede de linguagem cerebral (e não só!) que, semelhante ou identicamente definido como paralelo a outros seres do cosmos, existencializam uma igual performance de software cerebral.

Não se pode divagar, dirão alguns. Pois não. Mas penso que se poderá sempre questionar sobre as nossas origens e a nossa edificação antropogénica. Até porque, nem todas as respostas estão ainda sobre a mesa; ou seja, há muito ainda por explorar e por encontrar, mesmo que muitos não estejam de acordo que fomos pensados e aprimorados à sua imagem e semelhança, sejam «eles» deuses, seres superiores, ou simplesmente seres como nós, ainda que moldados e igualmente modificados, alterados ou manipulados segundo outros acordos, outras decisões, outras almas...

Oocorrendo da idade prénatal até à idade adulta em crescente e sequencial processo evolutivo de compreensão e desenvolvimento - mesmo que abordado sobre diferentes contextos culturais - a linguagem é assim a mais produtiva forma não só da partilha humana em se fazer perceber, como, de trocar essa informação na influência universal que esta exerce (a leitura através da junção e significado das palavras) num processamento cognitivo indiscutível.

Existindo até aqui várias teorias explicativas da «Aquisição da Linguagem» (em termos referenciais da Psicologia) - numa ainda não-resolvida questão sobre se é a nossa natureza ou a nossa educação que molda o que somos e o que fazemos - os cientistas que se debruçam sobre esta e muitas outras questões que inflectem sobre as áreas de linguagem do cérebro, dizem-nos agora de modo peremptório que já nascemos com uma parte do cérebro que é pré-programada para ser receptiva a ver e a distinguir palavras e letras; algo que sucede desde o nosso primeiro minuto de vida.

Investigadores da Universidade do Estado de Ohio (The Ohio State University/OSU), nos Estados Unidos, reiteram agora ter encontrado conexões com áreas de linguagem do cérebro, pelo que tendo analisado criteriosamente as varreduras cerebrais de vários recém-nascidos, foram surpreendidos com a descoberta de que esta parte do cérebro - chamada de «área do reconhecimento visual da forma da palavra» ou VWFA - está conectada à Rede de Linguagem do Cérebro.

O Cérebro: os avanços, as descobertas. A comunicação sendo importante estimula os cientistas a buscarem mais, sempre mais. Até mesmo na Interface «cérebro-computador» que consiste na comunicação directa entre o cérebro humano e um dispositivo externo. Ficção científica...? Não. Apenas o que as BCIs (Brain Computer Interface) hoje legitimam e repercutem em assistência e desenvolvimento na reparação de danos sobre funções motoras e cognitivas.

Nada fica ao acaso. E por muito que alguns sugestionem de que o estar-se a fabricar uma espécie de «homem-máquina» será o fim da Humanidade, ainda que os benefícios sejam muitos no entendimento e aprimoramento humanos sobre lesões cerebrais e motoras, há que ter em conta o ainda desconhecido que nos diz podermos ser tão ou mais superiores do que aqueles a quem essa qualidade ou premissa aventamos. E adoramos especular. Seremos nós assim tão diferentes...???

Se todos somos filhos do Universo então a discussão está aberta, se nos não enganarmos ou demitirmos do que actualmente já nos define e, identifica, como seres híbridos em constante evolução, transformação e mutação de há muitos milhares de anos...

Pré-programação

Poderá ser questionável quem o fez; deliberadamente ou não. O que sabemos hoje é que existem muitas áreas no cérebro que estão destinadas a várias e determinadas funções, sendo a «Àrea da forma visual das palavras» ou VWFA (uma pequena região envolvida no reconhecimento de símbolos linguísticos localizada na superfície cerebral, atrás da orelha esquerda) uma delas.

Segundo os Neurocientistas, a VWFA no hemisfério direito é a região facial fusiforme, que nos permite de forma nítida reconhecer faces/rostos. Em crianças muito pequenas e pessoas analfabetas, verificou-se (em experiências nas quais se observou o cérebro humano de algumas pessoas por meio de exames de ressonância magnética funcional ou fMRI) que em ambas as regiões havia a resposta aos rostos. 

À medida que aprendemos a ler, a área VWFA é incorporada para o reconhecimento das palavras. Segundo estes especialistas, à medida que nos tornamos mais proficientes na leitura, vamos construíndo também um certo dicionário visual na área VWFA, enquanto acumulamos um catálogo de rostos familiares no lado oposto do cérebro.

Daí que investigadores da Universidade Pública do Estado de Ohio (The Ohio State University), nos EUA, tenham recentemente descoberto que, esta parte do cérebro denominada VWFA, está de facto conectada à Rede de Linguagem do Cérebro.

Zeynep M. Saygin, autora-sénior do estudo e professora assistente de Psicologia da Universidade do Estado de Ohio, afirma: "Isto tornou-se num terreno muito fértil para que se possa desenvolver uma sensibilidade às palavras visuais - mesmo antes de qualquer exposição à linguagem."

A VWFA é assim especializada em leitura mas apenas para indivíduos ditos alfabetizados. Contudo, houve alguns investigadores que levantaram a hipótese de que, a VWFA pré-leitura, começa de facto a ser igual a outras partes do córtex visual que são sensíveis a ver rostos, imagens ou outros objectos, tornando-se somente selectivo para palavras e letras conforme as crianças aprendem a ler ou, pelo menos, à medida que aprendem a língua.

"Descobrimos que não é verdade. Mesmo no nascimento, a VWFA está mais conectada funcionalmente à Rede de Linguagem do Cérebro do que a outras áreas. É uma descoberta incrivelmente emocionante!"   (Exclama efusiva a professora Zeynep Saygin)

Saygin, que é membro do corpo docente do Programa de Lesões Cerebrais Crónicas do Estado de Ohio, nos EUA, conduziu o estudo com as alunas de graduação Jin Li e Heather Hansen e o professor assistente David Osher, todos licenciados em Psicologia no Estado de Ohio. Os resultados deste estudo foram publicados na revista científica «Scientific Reports» no dia 22 de Outubro de 2020.

(Este estudo tem por título «Os padrões de conectividade inatos conduzem ao desenvolvimento da área da forma visual da palavra» em Relatórios Científicos, 2020. Os seus autores são: Jin Li; David E. Osher; Heather A. Hansen e Zeynep M. Saygin.)

Os Investigadores da Ohio State University (OSU) analisaram então as imagens de fMRI do cérebro de 40 recém-nascidos - todos com menos de uma semana de idade -  que faziam parte do Projecto de Desenvolvimento do Conectoma Humano (Developing Human Connectome Project). De seguida, fizeram a comparação destas imagens com exames semelhantes de 40 adultos que participaram do projecto separado «Human Connectome Project». 

De acordo com os especialistas, especificamente nas palavras da professora Saygin «A VWFA está próxima de outra parte do córtex visual que processa rostos, sendo razoável poder acreditar-se não existir nenhuma diferença nessas partes do cérebro em recém-nascidos».

Como objectos visuais, os rostos têm algumas das propriedades das palavras, como a necessidade de «Alta Resolução Espacial» para que os seres humanos os vejam correctamente, segundo a explicação científica.

Todavia, os investigadores também descobriram que, mesmo em recém-nascidos, a VWFA era diferente da parte do córtex visual que reconhece rostos, principalmente devido à sua funcional conexão com a parte do processamento de linguagem do cérebro. 

"A VWFA (Visual Word Form Area) é especializada em ver ou detectar palavras antes mesmo de  sermos expostos a elas."    (Determina com precisão a professora Saygin)

Já a aluna de graduação e principal autora deste estudo - Jin Li - relata: "O nosso estudo realmente enfatizou o papel de já haver conexões cerebrais no nascimento para assim ajudar a desenvolver a especialização funcional, mesmo para uma categoria dependente de experiência como a leitura o é."

Assim sendo, há a registar que este estudo também encontrou algumas diferenças na VWFA em recém-nascidos e adultos. "As nossas descobertas sugerem que é bem provável que haja mais ou um maior refinamento na VWFA conforme os bebés vão amadurecendo."    (Anota Saygin)

Saygin esclarece ainda: "A experiência com a linguagem falada e escrita provavelmente irá fortalecer as conexões com os específicos aspectos do circuito linguístico e, diferenciará ainda mais, a função desta região das suas vizinhas à medida que uma pessoa se alfabetiza."

O Laboratório da Professora Saygin no Estado de Ohio, nos EUA, está actualmente a mapear/digitalizar por scanner os cérebros de crianças entre os 3 e 4 anos de idade para, desta forma, se poder aprender e compreender mais sobre o que a área da VWFA faz ou processa antes que as crianças aprendam a ler, assim como, quais as propriedades visuais a que a região responde.

O Objectivo Final será o de aprender como é que o cérebro humano se torna efectivamente «um cérebro de leitura». Segundo os investigadores da OSU «Aprender mais sobre a variabilidade individual pode ajudar os pesquisadores a compreender as diferenças no comportamento de leitura, podendo mesmo ser útil no estudo da Dislexia e outros transtornos do desenvolvimento».

"Saber o que esta zona ou região está a fazer nesta idade, ir-nos-à dizer um pouco mais sobre como o cérebro humano pode desenvolver a habilidade de ler e o que pode dar errado. É importante rastrear como essa região do cérebro se torna cada vez mais especializada."   (Frisa a professora Saygin)

Há a registar que esta pesquisa/investigação foi apoiada, em parte, pela Alfred P. Sloan Foundation. Há também a anotar de que, as análises, foram concluídas usando para isso o magistral supercomputador de Ohio (Ohio Supercomputer Center). 

Pré-programados para ler, escrever, memorizar e mesmo reeditar em arquivo absolutamente generoso e, maravilhoso, tudo o que o nosso cérebro põe e dispõe, da nascença à sepultura, é algo que por vezes nos transcende. E eterniza.

Provavelmente, seremos todos uns exímios e fiéis supercomputadores sem o sabermos. E sabendo, em indómita mestria de uma genealogia perdida de mestres e sábios de outras eras ou outras vidas, as aquiescências menores de outras almas maiores que nos idealizaram, geraram e conceberam em termos e fisiologias tão iguais ou tão diferentes a si.

Não sabemos. Por enquanto. Mas vamos aprendendo, lendo e relendo o que outros para nós têm guardado e, às vezes anunciado, de podermos ser os tais «pequenos seres» de um cosmos tão grande e tão infinito quanto os nossos humanos sonhos de sermos todos felizes. E vivermos eternamente.

Se fomos pré-programados para tal não o sabemos, desejando ardentemente que «eles» o não tenham esquecido (ou acintosamente preterido...) sobre estas pobres almas programadas e reprogramadas vezes sem conta... esperando talvez, uma outra programação que nos dite ainda virmos a ser a tal assumpção que não maldição de nos matarmos a todos. Pré-programados para nisso acreditar...? Seria bom que sim! De uma vez por todas!!!

Sem comentários:

Enviar um comentário