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quinta-feira, 17 de setembro de 2020

Da Fragilidade à Vitalidade

 

COVID-19 no mundo: do paciente-zero à disseminação (ou do ainda desconhecido «caso-índice» até à propagação), em particular na transmissibilidade do vírus SARS-CoV-2 na Europa e nos Estados Unidos. Testes abrangentes e a identificação dos casos são as mais poderosas armas na prevenção e controle de pandemias, segundo os cientistas.

Todavia estes recursos, estas medidas amplamente difundidas, farão eventualmente com que uma nova pandemia nos não seja tão corrosiva ou cruel quanto a que actualmente ainda nos confrontamos e debatemos...? Será difícil dar para já uma resposta. 

No entanto, e de acordo com um recente estudo elaborado pelos sempre criteriosos investigadores da Universidade do Arizona (EUA), poder-se-à reconstruir a propagação do coronavírus com todo o detalhe e sobre todo o mundo, combinando para isso a «Genómica Evolutiva» de amostras desse coronavírus com epidemias simuladas por computador e registos pormenorizados - ou detalhados - de viagens. Algo inédito e claro está sem precedentes.

Este estudo publicado na revista «Science» de 10 de Setembro de 2020 com o generoso título «O Surgimento do SARS-Cov-2 na Europa e na América do Norte», vem por este meio divulgar o benefício acrescido que é e será porventura em eventos epidemiológicos futuros, a obtenção e a integração de várias fontes de informação para uma melhor compreensão dessa propagação do vírus.

Tal processo, segundo vem explicado neste estudo, induz a que se combinem Reconstruções Genómicas - com abordagens complementares - tais como os registos de voo e o número total de COVID-19 em várias regiões globais; no caso específico e nos dados recolhidos sobre esta investigação, entre Janeiro e Fevereiro deste ano (2020).

Não será de somenos importância aqui relatar o que estes e muitos outros cientistas irão efectivamente consolidar através dos resultados deste estudo, sobre a relevância de uma «Intervenção e Detecção Precoces» que poderá ter um impacte enorme na Prevenção de Pandemias (e no controle das mesmas) se acaso se expandirem e progredirem.

Isto, de acordo com as palavras destes investigadores. Talvez por esta mesma razão a digníssima senhora Ursula Von der Leyen - Presidente da Comissão Europeia - admitiu em termos de liderança «Passar da Fragilidade para uma Nova Vitalidade» não só na área económica mas também de saúde pública; ou seja, reafirmando que chegou o momento de nos reerguermos (na Europa), desejando que haja de futuro uma verdadeira e coesa «União da Saúde Europeia».

Oxalá estas palavras da senhora Von der Leyen façam eco e se propaguem de forma audaz e segura, inversamente ao que se almeja de futuras e incontroláveis epidemias e pandemias, numa inegável voz de autoridade e autenticidade, idêntica e extensível ao resto do mundo; algo que será sobejamente reconhecido e seguido acredito, tendo em conta todos estes estudos, estas ilustres investigações, que darão certamente alguma luz a ainda certas e sombrias nuvens que por nós pairam.

Há que assegurar que estejamos melhor preparados e melhor convictos de uma maior e melhor administração de meios, recursos e informações para que, em futuras ocorrências epidemiológicas, sejamos mais pro-activos e mais exactos no debelar, conter ou controlar de todas elas. O mundo pode estar a mudar de facto, só temos agora é de estar preparados para essa mudança.

Prevenir, Informar, Testar e Identificar serão talvez os motes que nos darão a confiança necessária para que este e outros vírus nos não limitem ou restrinjam a normalidade dos tempos. Por isso é mesmo imperativo que passemos de imediato da «Fragilidade à Vitalidade», pois só assim recrudesceremos como Humanidade que somos e queremos fazer vingar; no bom sentido, claro!

SARS-CoV-2: antecipar e prevenir futuros surtos epidemiológicos, em especial os de COVID-19 e outras doenças zoonóticas, é agora o alvo de toda a comunidade científica que, baseada fluentemente neste estudo da revista Science (de 10 de Setembro de 2020), promete o fornecimento de valiosas informações que poderão dar uma mais pronta resposta no domínio da Saúde Pública.

A Expansão/Consolidação do Vírus

Muitos cientistas são taxativos: Não estávamos preparados! E não prevenimos, não testámos. Geralmente aprende-se com os erros, o que é humano como todos sabemos. Mas, à medida que o conhecimento se aflora e adensa sobre este mesmo vírus, menos esta premissa nos é dada.

Os Investigadores sugerem até que terá sido «Uma oportunidade perdida», essa sequência e desenvolvimento da propagação do SARS-Cov-2 na Europa e nos Estados Unidos.

Infere-se portanto, que a premência de se fazerem testes intensivos e o rastreio de contacto (distanciamento social, confinamento profilático ou quarentena em caso de positividade dos testes), são absolutamente necessários e vitais para que o vírus se não propague; algo que não foi atempadamente assegurado e reverteu para que essa expansão ou consolidação do vírus se registasse, permitindo a este ter-se instalado e estabelecido nestes dois continentes como o fez.

Michael Worobey que liderou uma equipe interdisciplinar de 13 instituições de pesquisa nos Estados Unidos, Bélgica, Canadá e Reino Unido, explicou sucintamente:

"A nossa aspiração era desenvolver e aplicar uma nova tecnologia poderosa para conduzir uma análise definitiva de como a pandemia se desenrolou no espaço e no tempo em todo o mundo. Antes, havia muitas possibilidades flutuando numa mistura de Ciência, média social e um número sem precedentes de publicações de pré-impressão ainda aguardando uma revisão por pares."

Sabe-se então que a equipe envolvida baseou a sua análise nos resultados dos esforços obtidos através do Sequenciamento do Genoma Viral, que começaram imediatamente após a identificação do vírus. Estes esforços rapidamente se transformaram num esforço mundial sem precedentes - em escala e ritmo - gerando assim dezenas de milhares de sequências de genoma, disponíveis publicamente em bancos de dados.

Ao contrário das narrativas generalizadas, as primeiras chegadas documentadas de indivíduos infectados que viajaram da China para os Estados Unidos e para a Europa não resultaram em surtos continentais, segundo a estimativa dos investigadores da Universidade do Arizona (EUA).

Em vez disso, medidas rápidas e decisivas, destinadas a rastrear e a conter as incursões iniciais do vírus  foram bem-sucedidas, devendo por esse factor servir de futuro como respostas-modelo para assim direccionar as também futuras acções políticas de Governos e Agências de Saúde Pública, na convicta afirmação dos investigadores deste estudo.

O Vírus-viajante: como o vírus chegou aos Estados Unidos e Europa. Ou, mais exactamente da China para o mundo, por muita especulação e negação que haja em termos sócio-políticos, de se rejeitar a evidência de um vírus que partiu de facto de Wuhan...

Um Clandestino sem «passaporte»...

O COVID-19 não gosta de fronteiras nem limites que o detenham. Infelizmente foi assim que este novo coronavírus se deu a conhecer (ou reconhecer) na infâmia global de uma pandemia.

Um Cidadão Chinês que voou de Wuhan - da China para Seattle, nos EUA (em 15 de Janeiro de 2020) - foi registado como o primeiro paciente em território dos Estados Unidos. Por se ter revelado infectado com o Novo Coronavírus e o primeiro a ter um genoma do SARS-CoV-2 sequenciado, foi designado como cidadão "WA 1". Só seis semanas depois, vários casos adicionais foram detectados no Estado de Washington, nos EUA.

"E, enquanto todo esse tempo passa, ficam todos no escuro e a interrogar-se: O que é que de facto está a acontecer?" Disse Worobey. "Esperamos que possamos ficar bem, esperamos que não hajam outros casos, e então fica claro, a partir de um notável programa de amostragem viral da comunidade em Seattle, que existem mais casos em Washington, e eles são geneticamente muito semelhantes ao vírus WA 1."

Worobey e os seus colaboradores testaram então a hipótese predominante sugerindo que o paciente WA 1 havia estabelecido um cluster de transmissão que não foi detectado por seis semanas. Segundo os investigadores «Embora os genomas revelados de Fevereiro e Março compartilhem semelhanças com WA 1, eles demonstraram ser diferentes o suficiente para que a ideia fomentada de que WA 1 pudesse estabelecer o surto subsequente fosse muito improvável.»

Subsequentemente também, as descobertas realizadas pelos investigadores sugeriram então de que, o salto da China para os Estados Unidos, provavelmente ocorreu por volta do dia 1 de Fevereiro de 2020.

Estes resultados sugerem igualmente um ponto final (ou um fim) nas especulações geradas de que, este surto - o primeiro grupo de substancial transmissão nos Estados Unidos - ter sido indirectamente iniciado pela dispersão do vírus da China para a Colúmbia Britânica, Canadá, e mesmo para o norte do Estado de Washington, nos EUA.

Depressa se espalhou do Canadá para os múltiplos genomas de SARS-CoV-2 dos Estados Unidos - em dados publicados pelo «Centro de Controle de Doenças da Colúmbia Britânica» - que pareciam ser ancestrais das variantes virais demonstradas do Estado de Washington, sugerindo fortemente uma origem canadiana/canadense da epidemia nos Estados Unidos. No entanto, há que ressaltar, o presente estudo revelou alguns erros de sequenciamento nesses genomas, descartando esse cenário...

Em vez disso, o novo estudo implica «Uma Fonte Directa da China» para o surto nos Estados Unidos, bem na época em que a Administração dos Estados Unidos implementou uma proibição de viagens para viajantes da China no início de Fevereiro.

A Nacionalidade do «caso-índice» do surto dos Estados Unidos não pode assim ser conhecida com toda a certeza, porque, dezenas de milhares de cidadãos americanos e portadores de vistos viajaram da China para os Estados Unidos, mesmo depois da proibição ter entrado em vigor.

Um Cenário Semelhante marca assim a primeira introdução conhecida do coronavírus na Europa. Em 20 de Janeiro de 2020, um funcionário de uma empresa de suprimentos automotivos na Baviera, Alemanha, veio de Xangai, na China, para uma reunião de negócios, sem saber claro está que carregava consigo o vírus - o que acabou por levar à transmissão e infecção do vírus em 16 dos seus colegas de profissão.

Há que referir que, neste caso também, uma impressionante resposta de testes rápidos assim como o devido isolamento projectado, impediu o surto de se espalhar ou disseminar ainda mais, na aguerrida conclusão do recente estudo dos investigadores da Universidade do Arizona.

Ao contrário da especulação instada por alguns, este «surto alemão» não foi a fonte do surto estabelecido no norte de Itália, também na Europa, que acabou por se espalhar amplamente sem contenção alguma pelo continente europeu e, eventualmente, para a cosmopolita cidade de Nova York e o resto dos Estados Unidos.

Os Autores deste Estudo quiseram também mostrar que esta rota de dispersão China - Itália - Estados Unidos, iniciou assim certos grupos de transmissão na Costa Leste dos EUA um pouco mais tarde no mês de Fevereiro do que o movimento China-EUA do vírus que estabeleceu o surto no Estado de Washington.

O Aglomerado de Transmissão de Washington também fez anteceder pequenos aglomerados de transmissão comunitária em Fevereiro no Estado da Califórnia, tornando-o desta forma o mais antigo de outro qualquer estabelecido na América do Norte.

COVID-19: 30 milhões de infectados e cerca de 950 mil mortos em todo o mundo. Números cruéis que recrudescem à medida que o tempo passa e que os meios escasseiam em vez de triunfarem, numa escalada ímpar de quase impotência, quase inércia e pouca combatividade, por parte de uma inoculação global eficaz.

Mas seria imprudente - e até mesmo injurioso - o não se reconhecer todos os esforços envolvidos no combate a este vírus. Intervenções intensivas e o não quebrar de regras serão passos importantes para contrariar esta invasão virológica. Se o conseguiremos ou não, é algo que ainda está no segredo dos deuses; no entanto, nada de esmorecer, pois cada vitória científica tem o sabor de mais uma batalha ganha, sendo que todas contam para essa aferição, essa contenção.

Prevenção/Contenção 

De acordo com os autores deste estudo há mesmo a necessidade urgente de se fazer uma certa contenção antecipada em trabalho árduo e não negligente se não se quiser verem repetidos os mesmos erros do início da pandemia. 

Dizem mesmo que «Intervenções Intensivas» mas também o envolvimento de testes, ou ainda um maior rastreio de contacto, medidas de isolamento e um alto grau de adesão por parte dos indivíduos afectados - que relataram os seus sintomas às autoridades de saúde e se isolaram em tempo útil - ajudaram a Alemanha e a zona de Seattle, nos EUA, a conter esses surtos em Janeiro.

O cientista Michael Worobey pronuncia-se mais uma vez: "Acreditamos que essas medidas resultaram numa situação em que as primeiras faíscas puderam ser eliminadas com sucesso, evitando que se propagassem ainda mais pela comunidade. O que isso nos diz, é que as medidas tomadas nesses casos são altamente eficazes e devem servir como um modelo para as respostas futuras a doenças emergentes que têm o potencial de se transformar em pandemias mundiais."

Para reconstruir o desdobramento da pandemia, os cientistas rodaram então impressionantes «Programas de Computador» que simulavam cuidadosamente a epidemiologia e a evolução do vírus - por outras palavras, como o SARS-CoV-2 se espalhou e sofreu de certa mutação ao longo do tempo.

"Isso veio permitir-nos repetir o filme de como a pandemia se desenrolou, uma e outra vez, e depois verificar os cenários que surgem nas simulações em comparação com os padrões que vemos na realidade."   (Explica Worobey)

Mas Worobey contempla ainda:"No caso de Washington podemos perguntar:'E se aquele paciente WA 1 que chegou aos EUA em 15 de Janeiro realmente iniciou aquele surto?' Bem, se ele fez isso, e você repassa aquela epidemia indefinidamente, e então tira uma amostra dos pacientes infectados daquela epidemia e desenvolve o vírus dessa forma, você obtém um padrão que se parece com o que vemos na realidade?...' A resposta é não, fideliza Worobey.

"Se você semear aquele surto italiano inicial com o da Alemanha, você vê o padrão que obtém nos dados evolutivos?... E a resposta novamente, é não!"   (Exclama o cientista)

O Co-autor deste estudo de seu nome Joel Wertheim da Universidade da Califórnia, em San Diego, nos EUA, resumiu em tom pragmático: "Ao repetir a introdução do SARS-CoV-2 nos EUA e na Europa por meio de simulações, mostramos que era muito improvável que as primeiras introduções virais documentadas nesses locais levassem a aglomerados de transmissão produtivos. As análises epidemiológicas moleculares são incrivelmente poderosas para revelar os padrões de transmissão do SARS-CoV-2.

Outros Métodos foram então combinados com os dados das epidemias virtuais, produzindo resultados excepcionalmente detalhados e quantitativos.

Marc Suchard, outro co-autor do estudo - pertencente à Universidade da Califórnia em Los Angeles (EUA) - remete por sua vez:

"Fundamental para este trabalho, está essa nossa nova ferramenta combinando então as tais informações detalhadas da história de viagem e de filogenética, que produzem uma espécie de 'árvore genealógica' de como os diferentes genomas de vírus demonstrados de indivíduos infectados estão relacionados entre si. As reconstruções evolutivas mais precisas a partir dessas ferramentas fornecem um passo crítico para entender de como o SARS-CoV-2 se espalhou globalmente em tão pouco tempo."

Philippe Lemey, também co-autor deste estudo e investigador da Universidade de Leuven, na Bélgica (UE) reverteu em jeito conclusivo: 

"Temos que ter em mente que estudamos apenas a evolução de curto prazo deste vírus, então não havendo por isso muito tempo para acumular muitas mutações. Adicione a isso a amostragem desigual de genomas de diferentes partes do mundo, e fica claro que há enormes benefícios a serem obtidos com a integração de várias fontes de informação, combinando reconstruções genómicas com abordagens complementares, tais como os registos de voo e o número total de casos de COVID-19 em várias regiões globais em Janeiro e Fevereiro."

Para terminar em beleza, o cientista Worobey rematou de forma clara: "A nossa pesquisa mostra que quando você faz uma intervenção precoce e uma detecção bem, isso pode ter um impacto enorme, tanto na prevenção de epidemias quanto no controle delas, uma vez que progridam. Embora a epidemia finalmente tenha passado, houve vitórias iniciais que nos mostram o caminho a seguir: Testes abrangentes e identificação de casos são armas poderosas!"

(Fontes de Financiamento do Estudo: Fundação David e Lucile Packard, os Institutos Nacionais de Saúde, o Conselho Europeu de Pesquisa, o Wellcome Trust e o Programa de Resposta Rápida ao Coronavírus dos Institutos Canadianos/Canadenses de Pesquisa e Saúde.

Nada mais a acrescentar que não seja as felicitações a todos os intervenientes sobre tão auspiciosas simulações que, porventura, salvarão vidas. Daí que talvez não seja de todo irreverente ou incipiente frisar as enfáticas palavras da Presidente da Comissão Europeia quando afirma que teremos de passar da «fragilidade para uma nova vitalidade», pois que frágeis não somos e vitais temos de continuar a ser em robustez e vitalidade. Assim seja pelo resto do mundo. 

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