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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

A Feitiçaria

Muitas são as razões que explicam o facto de serem sobretudo mulheres a ser consideradas bruxas, a ser consideradas responsáveis por estragar colheitas, por levar a cabo ritos misteriosos, espalhar doenças e lançar feitiços amorosos.

A Crença na Feitiçaria 

A crença em bruxas é um fenómeno muito antigo e de carácter universal, encontrando-se em relação estreita como o xamanismo. Todas as razões invocadas acima, de delegarem a culpabilidade nas mulheres sobre maleitas, doenças, más colheitas ou feitiçarias, já provém da Antiguidade mediante os cultos pagãos.
Sem dúvida de que a tendência feminina para a clarividência e a adivinhação desempenhou um papel importante, bem como os conhecimentos de que estas habitualmente dispunham na preparação de remédios naturais (e a proximidade à Natureza, indissociável desse facto). A figura da bruxa ganharia forma também, através de cultos pagãos da Antiguidade em honra de mulheres, como era o caso da deusa grega da caça e da fertilidade, Ártemis e, da sua correspondente romana, Diana.

 

O Medo da Mulher

A partir da Idade Média, passaram a ser consideradas perigosas não só as mulheres que possuíam conhecimentos sobre feitiçaria, como também, todas aquelas que viviam sem ser na companhia de um homem. O medo das bruxas era motivado pelo medo que os homens sentiam - em particular, o clero dominante - da ideia de uma mulher indómita e livre. Essa liberdade era imediatamente (e com especial ênfase) associada à devassidão sexual, o que apenas poderia significar uma coisa: essa mulher estava sob influências satânicas. A tradicional postura misógina da Igreja, potenciou (facilitando bastante) a rejeição desse tipo de mulheres e a sua classificação como bruxas.

O Bruxo como Lobisomem

Os homens que se revelassem socialmente inaceitáveis, eram também e igualmente suspeitos de se tornarem bruxos ou dedicarem à bruxaria. Uma vez que o lobo era associado ao Diabo, pensava-se que de noite certos bruxos se transformavam em lobisomens impetuosos. Presumia-se que o lobisomem era um «versipellis», isto é, que de noite virava a sua pele de lobo para fora, enquanto de dia, quando mostrava a sua figura humana, a pele de lobo estava virada do avesso, para dentro. Esta extravagante teoria, desenvolvida por um jurisconsulto francês, chamado Jean Bodin (1530-1596) num famigerado livro intitulado «Démonomanie des Sorciers» (1580), serviu de pretexto às mais horrendas torturas: àqueles de quem se suspeitava serem lobisomens, eram arrancados pedaços de pele do peito na obtenção a tentar encontrar a parte de dentro coberta de pêlos. Revelando-se isso impossível, ainda assim tal não queria dizer que o torturado estivesse inocente nem que, a tortura ficaria por ali.

Perseguição das Bruxas

A Igreja soube utilizar habilmente os receios das populações, ante pessoas dotadas de dons ditos «sobrenaturais», ao pretender detectar em todos fenómenos inexplicáveis os vestígios de um acto do Diabo. Tal prática, conduziu sobretudo entre os anos 1500 e 1700, a perseguições impiedosas movidas contra as mulheres que eram acusadas de ser bruxas, de serem amantes do Diabo (Crimen Exceptum) ou de praticarem magia (Crimen Magiae). Por meio de torturas conseguia-se identificar os bruxos e as bruxas e por fim, aniquilá-los. Esta verdadeira caça às bruxas acarretou não apenas tremendos maus tratos com vista à obtenção de confissões mas também, a contínua invenção de novos ordálios: em provas realizadas com recurso à água e ao fogo, chegando-se mesmo ao derramamento de sangue. Invocava-se então um poder superior, no sentido de este revelar a inocência ou deixar aplicar o castigo.
O médico flamengo Johannes Wierus (1515-1588), foi um dos primeiros a refutar publicamente com veemência, a noção generalizada de que as bruxas teriam um pacto com o Diabo. Wierus elaborou uma teoria de cariz psicológico, segundo a qual, se trataria de «pessoas melancólicas» que simplesmente imaginavam ter selado um pacto com o Diabo. Ainda segundo este, seriam mais dignas de dó e compaixão do que de punição, porém, até ao século XVIII muitas pessoas com doenças ou distúrbios do foro psicopatológico, eram acusadas de se dedicarem à bruxaria.

A Bula Papal e o «Malleus Maleficarum»

Em 1484, o Papa Inocêncio VIII - ele mesmo, um dos menos dignos da época renascentista - emitiu uma bula em que condenava as bruxas, e por meio da qual incentivava e promovia a funesta perseguição de mulheres suspeitas de serem bruxas. Ao abrigo desta bula, em 1487 foi publicado por Heinrich Institoris e Jakob Sprenger, o chamado «Malleus Maleficarum» (Martelo das Bruxas), onde a feitiçaria é caracterizada e são indicadas medidas para proceder à luta e perseguição contra as bruxas. Sob a influência desta obra difamatória, deu-se início a uma verdadeira histeria de perseguição em massa à feitiçaria, primeiro em França e no decurso do século XVI, também na Alemanha.
Esta espécie de loucura colectiva foi favorecida e fomentada pela instauração de tribunais que moviam processos inquisitórios - e reforçada pelas torturas - conseguindo-se assim «demonstrar» a todas as acusadas a sua culpa, para além de se obter confissões.

Ainda hoje, na actualidade, se fala de tortura e obtenção de culpa e subsequente castigo através de várias submissões dessa mesma tortura em dor e flagelação no corpo. Os métodos são diversos, havendo por todo o mundo ainda o debate de tal acontecer, em pleno século XXI. Uns estarão mais creditados do que outros para o fazerem, visto que as democracias se subjugam muitas das vezes a esse mesmo jogo (ou jugo) questionável na obtenção de informações e segredos de Estado. Não estamos na chamada «guerra fria» ainda ( ou novamente...) para que o mesmo se repercuta em similaridade do que outrora aconteceu. Contudo, continuam a existir «caças às bruxas» em determinadas zonas do globo e consoante as circunstâncias em insinuações de «Wikileaks» ou do tão afamado agora Edward Snowden que deu com a língua nos dentes e esventrou ao mundo que todos estariam a ser vigiados, ouvidos e investigados. Ninguém escapa, nem ele próprio que está em maus lençóis, caso venha um dia a ser capturado pelas forças de segurança dos Estados Unidos, a tão falada NSA. Como se constata, ainda existe por aí, muitas perseguições e julgamentos à semelhança do Malleus Maleficarum dos séculos passados. Não faço juízos de valor sobre uns e outros mas acredito de que um dia, sejamos mais puros ou menos ímpios na equidade de valores e princípios e tenhamos uma maior consciência de não nos martirizarmos nem o fazermos a ninguém. Por vias de escutas, torturas ou subjugação individuais, escolher em opção e livre arbítrio uma outra via de vida. É nisso que acredito. Ou seremos todos bruxos, feiticeiros ou demónios em busca de uma remissão de pecados há muito perdidos. Por salvação destas nossa almas, como ditam as regras cristãs, sejamos mais benevolentes e caridosos com os que nos desafiam e mesmo, nos magoam. A bem de todos!

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