Há almas eternas, outras imortais e talvez até mesmo outras confortavelmente emanentes sobre o Universo; cabe-nos a nós descobrir quais as que nós somos, por outras que andam por aí...
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terça-feira, 25 de fevereiro de 2014
A Ancestral Cidade
Ruínas (escavações arqueológicas) de Çatal Huyuk - Anatólia - Ásia Menor
Que se passou de tão enigmático com os nossos antepassados? Quem terá levado a cabo os esforços de domesticação de animais mais bem-sucedidos da História da Humanidade? Terão os homens da Idade da Pedra sido mais pacíficos que os que se lhes seguiram, demonstrando assim um maior grau de progresso?
Çatal Huyuk - Lugar de culto da Grande Deusa
No extremo sul do planalto Anatólio permaneceu enterrada durante milénios uma das primeiras cidades de todo o mundo. Quando em 1952 o arqueólogo britânico James Mellaart aí deparou com testemunhos da Idade da Pedra cobertos de terra, não fazia ainda ideia que debaixo da suave inclinação daquela colina se pudesse esconder algo de sensacional. Naquele mesmo lugar, há 8000 anos, haviam seres humanos da Idade da Pedra realizado um acto pioneiro e, inaudito. Sob a égide de uma divindade feminina de formas voluptuosas, os habitantes de Çatal Huyuk protagonizaram uma das mais invulgares evoluções culturais na História da Humanidade. As razões que terão levado a tomar este passo no sentido do progresso é precisamente aquilo que os investigadores da Antiguidade procuram desde há décadas no Próximo Oriente.
A Primeira Cidade
"Consegui distinguir restos de paredes queimadas, o que poderia querer dizer apenas uma coisa: tratava-se de casas, muitas casas. Não restaram depois disso quaisquer dúvidas no meu espírito: Çatal Huyuk era uma enorme cidade da Idade da Pedra." É deste modo que Mellaart descreve as suas primeiras impressões.
Os habitantes de Çatal Huyuk desenvolveram uma admirável vida em conjunto: como se de favos de cera se tratasse, construíram casas rectangulares e, transformaram-nos em complexos residenciais com pátios interiores. Os espaços interiores eram alcançados através de uma abertura no telhado por meio de escadas, uma vez que não havia ruas, nem sequer portas que permitissem a entrada para o interior. Ao que parece, esta forma de construção levava a que sucedessem muitos acidentes - como fica comprovado pelos esqueletos encontrados que evidenciam ossos com vestígios de fracturas.
Cerca de 10 mil pessoas terão habitado nessa cidade, que era simultaneamente o centro de um culto de fertilidade, como comprovam frescos e, estátuas ai existentes. Num contentor para cereais foi encontrada em perfeito estado de conservação, uma pequena figura de uma matrona Deusa-Mãe, prestes a dar à luz uma criança. Esta figura de formas generosas e, carnudas, personifica a capacidade reprodutora dos seres humanos, bem como da Terra.
O Fim dos Deuses
Assistiu-se por volta de 4000 a. C. ao fim súbito destes rituais em honra da Deusa-Mãe. Depois de invadirem esta região, povos Indo-Germânicos provenientes do Sul da Rússia introduziram religiões de cunho patriarcal. As deusas, ás quais de acordo com a mundivisão dos nossos antepassados se deve o progresso registado no Neolítico, foram tornadas supérfluas pelas novas crenças. é interessante registar que, juntamente com elas, também uma das antigas cidades conhecidas da História da Humanidade entrou em decadência.
O Segredo de uma Revolução
A Península da Anatólia e, em geral toda a Ásia Menor, foram até ao início do século XX consideradas regiões de fronteira entre culturas. Os Romanos construíram palácios e templos impressionantes sobre as ruínas da cultura selêucida que no século III a. C. nascera como herdeira das conquistas de Alexandre Magno. Antes disso, haviam vivido os Persas nestas terras.
O interesse dos estudiosos dos séculos XVIII e XIX concentrou-se sobretudo no que restava de antigos monumentos. Só a pouco e pouco é que achados mais antigos começaram a dar que pensar à comunidade científica. Passados três milénios em que estiveram envoltos pela escuridão da História, foram postos a descoberto por escavações, os restos do Império dos Hititas - um povo guerreiro que no segundo milénio antes da Era Cristã, fundou o reino de Hatti no Leste da Anatólia.
Esses estudiosos haviam também já deparado com os restos de antigas Cidades-Estados do início da Idade do Bronze a partir de 3000 a. C. - antes ainda de terem vindo parar a esta fértil península.
A lendária cidade de Tróia fora uma dessas antigas Cidades-Estados, porém não era a mais antiga povoação da Ásia Menor: 3000 anos antes - entre 8000 e 6000 a. C. - deverá Çatal Huyuk ter vivido o seu auge. Esta povoação neolítica encontrava-se cercada por uma muralha fechada. Se tal se destinava à protecção de ataques inimigos, parece no mínimo e de certa forma duvidoso, já que ao longo da sua milenar história não se encontram quaisquer vestígios de batalhas. Daí que se coloque a mera pergunta: Terão os homens da Idade da Pedra sido mais pacíficos que os que se lhes seguiram, demonstrando assim um maior grau de progresso? Esta questão fica no ar, pelo que apenas podemos supor.
Génios da Idade da Pedra
Em todo o caso, os habitantes de Çatal Huyuk deverão ter sido inventores fantásticos. A partir de 6000 a. C., a sua cidade desenvolveu-se não apenas enquanto centro de produção agrícola e de comércio mas também funcionou como um pólo de atracção para artistas, como certos artefactos funerários e pinturas murais dão a entender. Bastaram poucos séculos para que esta população da Ásia Menor evoluísse de uma sociedade tribal primitiva, para uma cultura citadina bem organizada.
O significado de tudo isto torna-se mais claro, quando pensamos que o ser humano passou dois milhões de anos, ou seja, 99 por cento de toda a História da Humanidade - como caçador e recolector - e a viver inserido em tribos errantes. De repente, porém, deu-se uma alteração decisiva, a chamada «revolução neolítica». O modo de vida, a organização económica, a técnica e a cultura alteraram-se de forma radical e então, o homem conseguiu a partir daí, passar a cultivar espécies de cereais que até então se haviam mantido silvestres - como é o caso do trigo e da cevada. Também animais que anteriormente viviam em estado selvagem, como carneiros, cabras e vacas, foram domesticados.
Pertence ao domínio da especulação, o modo como os nómadas terão conseguido alcançar tudo isto sem conhecimentos prévios de agricultura.
Em Çatal Huyuk pode estudar-se com base nos achados aí recolhidos, o modo como a relação entre o Homem, a Natureza e a técnica se foi alterando. Aquilo que desencadeou esta evolução apenas foi conhecido por estes génios da Idade da Pedra, tendo permanecido até aos nossos dias um segredo.
Ritos de Fertilidade
A crença em ritos de fertilidade tem-se mantido inalterada até ao século XXI. Os habitantes das ilhas Trobiand, um povo da Papua-Nova Guiné, continuam ainda hoje a praticar uma dança da fertilidade que imita o acto sexual; no Japão, por ocasião de festas de fertilidade, as mulheres carregam pelas ruas enormes falos de madeira. Estes últimos pretendem simbolizar a fusão do Céu e da Terra, e constituem uma condição necessária para que se verifique uma boa escolha de arroz.
Na Europa Central são colocadas bonecas de palha nos campos onde se acabou a colheita. Como referiu o antropólogo inglês James George Frazer (1854-1941), também em muitos costumes associados aos casamentos, estão contidos vestígios de antiquíssimos ritos de fertilidade dos nossos antepassados.
O Ponto de Partida da Civilização
Como inicialmente se referiu, surge-nos as questões sobre este povo: Que se passou de tão enigmático com os nossos antepassados? Quem terá levado a cabo os esforços de domesticação dos animais mais bem-sucedidos da História da Humanidade? Ainda hoje, não somos capazes de domesticar certos animais, como as gazelas, transformando-os em espécies das quais possamos tirar proveito. Foi esta «economia de produção» que constituiu a condição básica para um novo estádio de evolução da civilização. Associada a ela está a permanência, o sedentarismo, a construção de locais de residência e de meios de obtenção de água, bem como o estabelecimento de estruturas de comunicação. Desde então as evoluções técnicas permitiram ao ser humano actuar deliberadamente sobre a Natureza.
Pela primeira vez, uma espécie do reino animal conseguiu impor-se não por um processo de adaptação genética mas, através de evolução cultural, mesmo sob condições diferenciadas em termos de meio envolvente.
Em Çatal Huyuk permaneceram escondidos muitos tesouros históricos que se mantiveram em óptimas condições até aos nossos dias, não só por condições climáticas benéficas como pela situação geográfica do local. Tanto nos museus turcos como no próprio recinto arqueológico estão expostos artigos de louça, pinturas murais, armas cortantes feitas de obsidiana, ossos de animais, esqueletos humanos e instrumentos de pedra. As escavações foram tão meticulosas que se tornou possível ficar com uma imagem muito detalhada da vida e, do quotidiano dos habitantes de Çatal Huyuk. Ter-se o conhecimento e, a verdade histórica desta ancestral cidade de Çatal Huyuk, é ter-se a dimensão real de toda a potencial cultura do que nos faz ser hoje cidadãos do mundo em descoberta e, revelação. Que assim possa continuar a ser! A bem do conhecimento! A bem da Humanidade!
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