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terça-feira, 29 de novembro de 2016

Nas Asas de Deus

Resultado de imagem para avião que caiu da bolívia para colômbia
A sempre incompreensível tragédia que acolhe nos braços de Deus, qualquer Deus, quem tanto ainda tinha por viver. Desígnios insanáveis de outros deuses, outras missões extraterrenas...

A Morte que sopra no sussurro da noite...
Vem com os ventos, as tempestades ou, inversamente, acomoda-se cruel e covardemente, sob os auspícios de um chamamento, de um lamento que ninguém ouviu. A Morte fez-se anunciar e, com ela, trouxe a hecatombe dos inocentes, dos que ainda jovens ou menos jovens, sucumbiram ante todas as esperanças, as vivências e, todas as bonanças de um dia serem os eleitos de toda uma vida. Tal não aconteceu, havendo a trágica repercussão aérea que, em ceifa e em despicienda ablação do que ainda se não viveu, sentiu ou amou, arrancou de nós.

Medellín: 21 h 33 m - (2 h 33 m de Lisboa) - O avião que nunca chegou...
Não sei os seus nomes nem poderia. A matinal e fatídica notícia acordou o mundo, o meu mundo; e que importa a hora, o local ou o momento em que, almas como nós, partiram para sempre...?!
Tripulação, passageiros, gente como a gente, gente como nós, gente que se faz voar e sonhar para os braços de um sonho, de uma quimera ou, simplesmente, de um destino a cumprir, nada mais. Ou sempre mais, sabe-se lá. Não chegaram. Não cumpriram nada disso e lamenta-se. Mais uma vez a missão foi interrompida ou talvez não, quem o saberá...? Deus (se há Deus...?) lá o creditará nos seus longos e universais braços de todo o conforto, de toda a sua magnânima sapiência - e omnipotência - de uns serem recolhidos mais cedo do que outros. Quem O defrontará...?

De «Viru Viru» (Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia) até... aos céus...
A Colômbia foi a jazida; foi a última guarida de cais e embarque, partida e chegada; depois de tanta alegria e festividade a partir da Bolívia, no seu último sopro e sentir terrenos de todas as almas. Assim: num murmúrio ou estertor da morte fingida mas efectiva.
81 almas que voaram nas asas de Deus mas que, Ele, nem todas recebeu. Seis delas têm de continuar (das sete resgatadas ainda com vida, pelo que uma das vítimas faleceu a caminho do Hospital, segundo os últimos relatos vindos a público; já em confirmação oficial), e assomar uma outra missão, uma outra afeição de vida e de morte, pois que os que seguiram para os céus, para outros voos, já planam numa outra condição.

CP2933 - O Voo que se perdeu...
Pouco importam os pormenores, as quezílias, ou as muitas demandas do que causou ou não mais uma tragédia aérea nos céus e solos da América do Sul.
A aeronave CP2933 não continuou, não aterrou. As suas almas elevaram-se; grande parte delas. Choramos por elas, lamentamos a sua desdita mas nem sequer nos apercebemos de quão felizes eles estão, agora, sem que nos contemplem as tristezas, as mágoas, as lágrimas e as aflições humanas de os não termos por perto - física e exemplarmente - nos jogos da vida que entretanto se esfumaram tal como as suas jovens vidas de tantas promessas, tantas realidades agora adversas.

Onde estais, ó almas imensas...?
Ficaram perdidas, as almas dos que já foram. Perdidos, desmembrados e não entendidos, como, naquela fria e inóspita montanha de ninguém, se perpetuavam em grupos silenciosos e, invisíveis, de uma neblina ténue que os engolia sem explicação. Não se viam mas sentiam-se. E observavam os que, não os vendo, gritavam de dor e suplício sem que eles os pudessem auxiliar; aos vivos. E, nessa zona montanhosa dos que ficaram, dos que imobilizados pelos destroços e pela agonia de estarem encarcerados, se vêem destronados de forças mas não do ímpeto de se saberem vivos. O fogo inicial (ou a cisma do Inferno em falsidade e galanteio, pelo que mais tarde as caixas negras ditaram de não ter havido explosão...?!), o cheiro a combustível queimado (ou o que deste restou) colado às roupas e às almas, e os gritos entrecortados de quem ainda luta por viver, misturados com o orvalho gélido e mortificador que lhes entra pelas entranhas, dá-lhes a sensação de estar perto de um fim que não pediram, que não pensaram, e muito menos sonharam tão depressa viver. Mas não houve opção nem arbitrariedade para tal; algo ou alguém decidiu por eles - todos - ou quase todos...

La Unión vestiu-se de negro...
E o aeroporto ali tão perto... mas tão longe de se chegar... E esses 50 quilómetros de nada, foram tudo na vida de tantas almas que então pereceram sem chama, apelo ou intrépido convite de uma sobrevivência sem limites. Cerro Gordo, a última morada. A primeira de outras...
Unidos na vida; unidos na morte: A Equipa Brasileira de Futebol Chapecoense está junta, coesa dos esforços e dos sonhos, muitos, que aí vêm. Ou vinham...
Nunca viram o raiar da madrugada em Medellín; nunca sentiram a alva manhã de todas as confianças ou entregas de corpos jovens, mentes sãs, e todo um burburinho juvenil de quem tem o viço ou exuberância não só da juventude mas, de todo um mundo por abraçar e conquistar. Não aconteceu.

Nas Asas de Deus...
O Campeonato Sul-Americano de Futebol (Copa Sul-Americana) está de luto. E o resto do mundo com este. E, com todos os que nele intervêm e nele participam, além os familiares das vítimas agora identificadas. Choramos com eles, sentimos a sua pesada perca e dor de todos; além os que compunham a tripulação da aeronave, assim como todos os outros restantes passageiros deste famigerado voo aéreo que se despenhou sobre o solo da Colômbia.

Quero acreditar que os que já partiram estão, de facto, sob a égide de Deus, um qualquer Deus que os mantenha solidários, unidos e sempre determinados a cumprir novas missões. É certo que muito ficou por realizar, por efectivar... ou talvez não. Não sei.

Mas sei - ou pressinto - o tanto que terá ficado por dizer ou, no tanto que haveria ainda por fazer, complementar, edificar, viver ou rejuvenescer em acções e emoções que jamais se reabilitarão, mas que, talvez, sejam as que já foram ditas (em palavra ou expedita comoção), no que para sempre se recordarão como as mais fiéis insígnias do que fazemos nesta vida. E que, possivelmente, jamais se esquecerão, por todos os que deixaram a sua marca no terreno, por todos os que um dia sorriram e sentiram que valeu a pena viver!

A todos eles, a minha singela e mui emocionada homenagem por me saber, feliz ou infeliz, privilegiada ou sequestrada de aqui estar mais um dia... na Terra. Um dia nos encontraremos... nas Asas de Deus...!

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