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domingo, 18 de junho de 2017

De Luto!

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Pedrógão Grande (Leiria) - Portugal: Quando a indómita fúria das Forças da Natureza tudo engole, numa extensa e maléfica língua de fogo realizada por um raio atmosférico de um deus menor... (e tudo isto num contexto inacreditável de atípicas temperaturas, segundo alguns, superiores a 40 graus positivos no mês de Junho, encimado de fenómeno imprevisto) e sob uma força operacional de bombeiros, voluntários e outros operacionais no terreno, elevados ao milhar e meio de homens e mulheres que tudo fazem para minimizar esta horrenda catástrofe - a maior de há 50 anos!

De Luto nos vestimos; de luto vos choramos!
De vermelho sangue desistidos, imbuídos de uma dor maior que aqui se não pode explanar, adornados pela consternação agora verificada dos que, pelo cansaço e pela ofegante e inusitada fuga (avassaladoramente inútil) de quem foi colhido e ceifado por entre as árvores endemoninhadas pelo fogo e apenas se deixou tombar ante o desespero e a dor de uma morte que se não fez apresentar - somos também nós colhidos, pela dor e pela angústia, ambas impotentes de nada termos feito para os salvar.

Quase não consigo descrever por palavras todo o horror passado nesta vasta região de um distrito afecto a Fátima (Leiria) - mas extensivo a toda esta sobre zonas circundantes de Pedrógão Grande desse mesmo distrito - àquela mesma região sagrada da Santa Senhora que tanto lhe devemos, que tanto lhe arrogamos em súplica e em graças; agora em desalento e em desesperança, por tantas almas já terem sucumbido à selvática voragem de vidas e bens.

17 de Junho: 15 horas da tarde, o alerta foi dado. Os bombeiros foram poucos, escassos ou não completamente decididos ou replicados na confusão de centenas de ocorrências florestais em desbragado fogo de origem (dizem agora os especialistas) por mão divina, que foi mão pesada, ainda mais pesada que a humana aquando assim deita e alastra tantos outros fogos de origem criminosa.

Desta vez foi uma Trovoada Seca, das piores; daquelas que os nosso avós e bisavós ou demais antecessores já prediziam provenientes do Demo, do Capeta, ou Chifrudo, do Belzebu, ou daquela coisa feia que um dia foi anjo e se esqueceu disso. E tudo levaria com ele através dos tempos, de vidas inocentes, de animais de seu sustento e, de férteis campos, isentos depois de tudo os que os viu ser algo que já não é mais...

18 de Junho: Pelas 4 horas da madrugada que ainda era noite, noite de fumo e cinzas que tudo cobriam e nada na escuridão se aludia a quem quer que fosse, já se contavam pela estatística nacional da Autoridade da Protecção Civil, 25 vítimas mortais, vulgo mortos confirmados e uns quantos feridos - 11, na sua parca contagem que subiriam pela manhã na estatística (10 horas/tmg) para 59, e de mortos registados, 57 (aumentando o número de vítimas mortais à medida que se vai conhecendo a extensão no terreno sobre esta ocorrência). Uma tragédia!

19 de Junho: últimos dados oficiais: 62 mortos confirmados e 62 feridos, que se alongariam para 134 feridos, ao rolar da tarde, e mais duas mortes (64), segundo dados do INEM (Instituto Nacional de Emergência Médica). O combate aos fogos continuou assim, após dois dias de intensa perseguição e luta no vasto incêndio que se propagou (e distendeu) para outras zonas, outros distritos; além o avolumar de interrogações - e responsabilização - que refutam agora a ideia inicial de se ter tratado de um fenómeno da Natureza (um raio sobre uma árvore).

Havendo a suspeita haverá também a dúvida sobre esse raiar de fogo posto por mão humana de quatro frentes e, a devida (ou indevida) ajuda por parte dos bombeiros que se não fez sentir, deixando as populações à sua sorte de balde de água na mão e o credo na boca, orando a Deus pelas suas vidas. De fenómeno meteorológico imprevisto à dita sequência sazonal de criminoso empenho, a expectativa geral é de que tudo fique na mesma sem grandes modificações ou alterações... além a que as ocorrências climáticas já por si tão alteradas nos sugerem...

Apressaram-se as condolências, as veemências - e os abraços - mas também as urgências e as solidariedades; sempre tão pouco leais, tão pouco sentidas ou forjadamente exibidas sobre as luzes incandescentes dos holofotes e das câmaras de televisão, e dos jornalistas; e também dos restantes presentes, senhores de altos cargos mas poucos conhecimentos ou pouca união e afectação, não tanta ou igual à dor dos que ficaram e tanto penaram por saber dos seus familiares, desaparecidos ou carbonizados já, sob as esteiras ardidas dos campos de ninguém.

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Quando tudo arde, até a voz da razão que se enevoa - e ofusca - se desentende, sem haver atalho, desvio ou caminho certeiro por onde ir, por onde passar por entre o inferno da fornalha, entregando-nos à morte, devolvendo-nos à simples condições de mortais. Depois, nada mais importa, nem mesmo o chilrear ao longe do último som que se ouve quando uma alma deixa a Terra...

O caminho da Morte...
E sobre os caminhos malditos se fez a inglória perdição na anulação da vida; sobre os automóveis, tumulares receptáculos que os abrigaram no último suspiro de vida, jazem homens, mulheres e crianças (ou «somente» os restos que se não reconhecem a não ser pelos testes de ADN em análise forense), e todos seriam iguais na morte que o não foram em vida. E tudo calcinado, e tudo perdido... Que mais nos resta do que chorar o que há muito é sabido...???

Inimaginável o inferno vivido; inalcançável o sofrimento e todas as dores do mundo de quem já não é gente e só se lamentou pelo que se não disse, pelo que se não afirmou em último cumprimento de vida sobre eles. Agora, que mais haverá por dizer - ou por fazer - no que ano após ano este meu tão mártir país vai passando sobre trevas inescrutáveis, sobre desígnios indetermináveis sobre o Homem que tudo diz poder e nada efectivamente fazer ante tamanha desgraça nacional de incêndios calamitosos?!

Continuamos à espera; continuamos em sofrimento e assim vamos andando.... devagarzinho e sem metas por alcançar, sem um concílio nacional que nos dite termos de mudar; mudar tudo. Mas, para quem assiste de longe sem sentir o cheiro da fumaça, o calor das entranhas da terra em cilício, os gemidos de quem ainda vive mas se apartou da alma, daquela que lhe diz para continuar, para não partir e lutar, que haverá a fazer, que haverá mais ainda a transformar para que não sejamos, todos, e em breve, uma cratera aberta de cinzas e pó que um dia se chamou Portugal?!

E se no Reino Unido se choram as mortes, mais exactamente sobre um edifício em chamas que agora é um cemitério de almas de todas as etnias, de todas as religiões e credos e de todas as vicissitudes de um chão e de um céu que é de todos, que dizer deste meu pequeno país de tão pobres almas que sempre que chega o Verão (ou mesmo antes disso) se deixa morrer às mãos de um Lúcifer há muito conhecido...?! E se o Inferno chegou primeiro à torre Grenfell (em Londres), ceifando 79 almas, como esquecer tudo o resto em vidas perdidas, lá e cá, ou onde for...?!

Dizia eu não ter palavras; como sempre. Mas sufrago-as na mágoa e na lucidez de uma dor calada, amordaçada, de uma contínua matança de gente que só quer viver por entre o pouco verde que lhe resta, ainda, de um país, de um chão (ou de uma nação há muito suplantada também) de se não ver somente à beira-mar plantado.

As minhas condolências aqui ficam - mais umas, pois que, sem ser alguém, sou também gente que sente e se preocupa por não poder ajudar ou simplesmente abraçar quem já nada tem. E para isso, não são precisos afectos desafectuosos e pouco caridosos (ainda que muito lastimosos à priori) de quem só sente por si, pelo que é seu, ou quer em seu benefício além as dores, além o que o povo realmente sente nestas horas de aflição.

Somos todos gente de bem; ou quase todos. Somos Portugueses e estamos unidos nessa dor, nesse sentimento. Como diria hoje se fosse vivo o meu antepassado Marquês de Pombal:
«Agora há que enterrar os mortos e cuidar dos vivos» - determinação do Primeiro Ministro de Portugal de então (Marquês de Pombal) ao seu Rei e Senhor: El-Rei de Portugal D. José I, aquando o terrível terramoto de 1755, em Lisboa. A termos aprendido com os erros, fiquem-nos as glórias de outros tempos e esses mesmos erros do passado para os não cumprirmos no presente ou no futuro. Que Assim seja!

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Imagem da NASA em observação/identificação dos incêndios registados no centro-norte de Portugal.

E tudo não sendo um breve pesadelo, em registo e constatação do que a NASA nos mostra - e revela ao mundo via satélite desta nossa aflição - temos ainda de viver com a culpa e a sujeição de sermos, apenas, um povo em sofrimento... ainda que muitos outros venham em nossa salvação, em nosso auxílio e compaixão...

PS: Muito Obrigado, UE, pela prestação e auxílio através de meios aéreos no combate aos incêndios. (Entre outros países do sul da Europa nessa idêntica prestação) ou mesmo o Brasil, país-irmão de Portugal, que se prontificou de imediato em nos prestar socorro por via aérea, embora os ventos, o fumo cerrado e demais contingência atmosférica, no momento, o não permitisse nessa condição. Rezem por nós. Obrigado a todos e um abraço deste Portugal ainda em chamas...

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